O mercado financeiro brasileiro iniciou o mês de dezembro com uma movimentação atípica e extremamente positiva para um setor que andava esquecido. As empresas ligadas ao ensino superior e básico registraram uma valorização expressiva nos pregões recentes, chamando a atenção de grandes corretoras. Esse movimento de alta não é apenas um respiro pontual, mas o início de uma tendência robusta para 2025. Gestores da XP Investimentos, uma das maiores casas de análise do país, revisaram suas projeções e colocaram essas companhias no topo da lista de recomendações. A mudança de perspectiva ocorre em um momento crucial da economia nacional, onde a expectativa de queda na taxa de juros futura (DI) favorece empresas alavancadas e dependentes de crédito estudantil.
A reavaliação dos ativos educacionais parte de uma premissa macroeconômica que começa a se consolidar entre os economistas para o próximo ano. Com a inflação dando sinais de trégua e o Banco Central sinalizando um ciclo de afrouxamento monetário mais consistente, o custo da dívida dessas companhias tende a cair drasticamente. Isso libera caixa para investimentos e melhora a margem líquida, tornando o balanço financeiro muito mais atraente para o acionista. Além disso, o aumento da renda disponível das famílias brasileiras, impulsionado pela queda do desemprego, reativa a demanda por cursos de graduação e especialização, que haviam sido cortados do orçamento doméstico nos anos de crise.
O otimismo da XP não é isolado, mas é o mais vocal neste momento, influenciando diretamente o fluxo de capital estrangeiro para a B3. Os relatórios divulgados apontam que os múltiplos (relação preço/lucro) das empresas de educação estão historicamente descontados, ou seja, as ações estão baratas em relação ao que as empresas podem entregar de resultado. Essa assimetria de preço cria uma janela de oportunidade rara para quem busca valorização de capital a médio prazo. O setor, que sofreu com a reestruturação do FIES e a pandemia, parece ter finalmente encontrado um novo ponto de equilíbrio operacional e financeiro.
Ações de aprendizagem em alta
A análise detalhada dos gestores aponta que a eficiência operacional alcançada nos últimos dois anos é o grande diferencial competitivo atual. As grandes holdings educacionais, como YDUQS (YDUQ3) e Cogna (COGN3), realizaram ajustes severos em suas estruturas de custos, fechando campi deficitários e investindo pesado em digitalização. Agora, com a casa arrumada, qualquer aumento na receita se traduz quase imediatamente em lucro na última linha do balanço. A aposta da XP reside na tese de que o mercado ainda não precificou essa nova realidade de “empresas enxutas”, tratando-as como se ainda estivessem no cenário caótico de 2022.
Outro vetor de crescimento identificado é a retomada dos programas governamentais de incentivo ao acesso universitário, que voltaram à pauta política com força. O governo federal tem sinalizado a ampliação de programas como o Prouni e uma reformulação do FIES para torná-lo mais sustentável e acessível. Para as companhias listadas na Bolsa, isso significa um aumento direto na base de alunos matriculados sem a necessidade de elevar os gastos com marketing (CAC). A XP destaca que essa “ajuda” governamental, somada à eficiência privada, cria um cenário de tempestade perfeita — no bom sentido — para a valorização dos ativos.
É importante notar, contudo, que a recomendação de compra vem acompanhada de uma seletividade rigorosa por parte dos analistas. Nem todas as empresas do setor estão no mesmo patamar de maturidade ou saúde financeira. A preferência recai sobre aquelas que diversificaram suas receitas, investindo em cursos de medicina (que possuem tickets médios altíssimos e inadimplência zero) e em educação continuada. O ensino a distância (EAD), embora volumoso, enfrenta uma guerra de preços predatória, o que faz com que o foco dos investidores se volte para o ensino presencial premium e para as graduações na área de saúde.
Setor acadêmico avança nos pregões
A performance recente dos papéis na B3 reflete uma antecipação dos investidores institucionais, que costumam se posicionar antes do grande público de varejo. Fundos de investimento locais começaram a aumentar sua exposição ao setor educacional ainda em novembro, o que explica o volume financeiro crescente nos últimos dias. A leitura é que, se os juros caírem conforme o esperado em 2025, o consumo discricionário (aquele que não é essencial, como alimentação) voltará a crescer, e a educação é a prioridade número um para a classe média emergente. Educação dispara na Bolsa justamente porque é o primeiro setor a reagir quando a perspectiva de renda futura melhora.
Criticamente, é preciso avaliar os riscos inerentes a essa tese de investimento, que não são desprezíveis neste cenário. A dependência de regulação governamental é sempre um ponto de atenção, pois uma simples “canetada” do Ministério da Educação (MEC) alterando regras de EAD ou de abertura de novos cursos de medicina pode impactar as margens. Além disso, a concorrência com plataformas de ensino não reguladas e cursos livres online impõe um desafio constante de renovação pedagógica. A XP, em sua análise, pondera esses riscos, mas conclui que o preço atual das ações já desconta o “pior cenário”, oferecendo uma margem de segurança confortável para o investidor.
A tecnologia também desempenha um papel fundamental nessa nova fase de crescimento das empresas educacionais brasileiras. A implementação de inteligência artificial para personalização do ensino e para automação de atendimento ao aluno tem reduzido custos administrativos de forma brutal. As empresas que lideram essa transformação digital estão conseguindo entregar uma experiência melhor com um custo menor, o que agrada o mercado financeiro. A aposta, portanto, não é apenas na educação tradicional, mas em “edtechs” disfarçadas de universidades, capazes de escalar seus modelos de negócio sem a necessidade de construir prédios físicos caros.
Papéis de educação valorizados hoje
Olhando para os destaques individuais, a YDUQS aparece frequentemente como a “top pick” (escolha principal) nos relatórios distribuídos aos clientes. A empresa conseguiu consolidar uma posição de liderança no segmento premium com o Ibmec e possui uma das maiores operações de medicina do país. Esse mix de produtos blinda a companhia das oscilações econômicas mais fortes, pois o estudante de medicina raramente abandona o curso. A Cogna, por sua vez, é vista como uma aposta de “turnaround” (virada), com um potencial de valorização percentual maior caso consiga entregar o crescimento prometido na sua divisão de ensino básico, a Vasta.
O Grupo Ânima também figura entre as recomendações, embora com ressalvas sobre seu nível de endividamento, que ainda é alto. A estratégia da XP para o setor envolve uma carteira diversificada, mas com peso maior nessas empresas que demonstram capacidade de geração de caixa livre. O investidor pessoa física deve estar atento aos relatórios trimestrais que serão divulgados no início de 2026, pois eles confirmarão se a tese de “melhora operacional” está se concretizando nos números frios da contabilidade. A transparência na comunicação com o mercado será vital para manter a confiança alta.
Por fim, a mensagem clara dos gestores é que a janela para entrar no setor pode não ficar aberta por muito tempo. À medida que os dados econômicos de 2025 forem se confirmando, o preço das ações tende a convergir para o valor justo, eliminando o desconto atual. Quem se posicionar agora, ainda em meio às incertezas, estará comprando o “rumor” fundamentado para vender no “fato”. O setor de educação, que já foi o patinho feio da Bolsa nos últimos anos, ressurge das cinzas não por milagre, mas por pura matemática financeira e ajuste de gestão.
