O Tribunal de Justiça do Amazonas proferiu uma decisão impactante nesta sexta-feira (12), alterando drasticamente o rumo das investigações sobre a morte do menino Benício.
A desembargadora Carla Maria Santos dos Reis revogou o Habeas Corpus preventivo que protegia a médica Juliana Brasil Santos de uma eventual prisão.
Essa medida judicial ocorre em um momento crítico, apenas quatro dias após a técnica de enfermagem Raiza Bentes ter um pedido similar negado pela justiça.
A disparidade anterior nas decisões judiciais havia gerado uma forte onda de críticas por parte da sociedade e de juristas que acompanham o caso.
Agora, com a queda da liminar, a pediatra perde a blindagem jurídica que impedia sua detenção preventiva durante o andamento do inquérito policial.
A Polícia Civil do Amazonas, liderada pelo delegado Marcelo Martins, pode a qualquer momento representar pela prisão caso entenda haver riscos à ordem pública.
O caso Benício, que envolve a morte de uma criança de 6 anos após superdosagem de adrenalina, chocou o país pela sucessão de erros.
Entenda o Caso: Menino morre ao receber adrenalina na veia em hospital de Manaus
A família da vítima recebeu a notícia da revogação com um misto de alívio e expectativa por justiça, clamando por rigor na apuração.
Revogação Liberdade Médica
A decisão da desembargadora Carla Reis baseou-se em novos elementos trazidos aos autos, que indicam a necessidade de igualdade no tratamento das investigadas.
Anteriormente, a defesa da médica havia conseguido o salvo-conduto alegando que não havia “dolo eventual” em sua conduta inicial no atendimento ao menino.
No entanto, a investigação policial avançou e trouxe à tona indícios de que houve tentativas de adulteração de provas logo após o óbito.
Esse comportamento pós-delitivo, segundo especialistas, configura um risco real à instrução criminal, justificando a necessidade de medidas cautelares mais severas contra a profissional.
Além disso, a negativa do Habeas Corpus para a técnica de enfermagem criou um precedente que pressionou o judiciário a reavaliar a situação da médica.
O desembargador Abraham Peixoto, ao negar o pedido da técnica, citou riscos à ordem pública e a gravidade concreta do crime de homicídio qualificado.
Portanto, a manutenção da liberdade da médica, enquanto a técnica permanecia exposta à prisão, feriria o princípio da isonomia processual entre as partes envolvidas.
A defesa da médica Juliana Brasil sustenta que o erro foi sistêmico e que a profissional agiu para tentar salvar a criança após o ocorrido.
Contudo, as mensagens de WhatsApp interceptadas pela polícia mostram a médica admitindo explicitamente o erro na prescrição logo após o agravamento do quadro.
Dessa forma, a narrativa de falha exclusiva do sistema ou da enfermagem perde força diante das evidências documentais e testemunhais colhidas até o momento.
Tragédia Hospitalar Manaus
A noite de 22 de novembro de 2025 ficará marcada para sempre na memória da família Xavier como o início de um pesadelo interminável.
Benício, um menino saudável e cheio de vida, deu entrada no Hospital Santa Júlia apresentando apenas um quadro de tosse seca e laringite.
A médica Juliana Brasil prescreveu, então, a administração de adrenalina, um medicamento potente utilizado para reações alérgicas graves e paradas cardiorrespiratórias, mas com restrições.
O erro fatal ocorreu na definição da via de administração: a droga foi injetada diretamente na veia da criança, em vez de ser inalada.
O pai de Benício, Bruno Freitas, relatou em depoimento que questionou a técnica de enfermagem sobre a aplicação venosa, pois estranhou o procedimento.
Segundo ele, a técnica respondeu que, embora nunca tivesse aplicado daquela forma, seguiria a prescrição médica que constava no sistema do hospital naquele momento.
Imediatamente após a injeção, Benício começou a passar mal, relatando que seu “coração estava queimando” e apresentando palidez extrema e extremidades arroxeadas.
O desespero tomou conta do leito enquanto a saturação de oxigênio da criança despencava para níveis críticos, chegando a 75% em poucos minutos.
A equipe médica tentou reanimar o menino, que sofreu uma sequência devastadora de seis paradas cardíacas antes de falecer na madrugada do dia 23.
A dor da perda foi agravada pela sensação de impotência dos pais, que viram o filho entrar andando no hospital e sair sem vida.
Investigação Erro Fatal
A Polícia Civil trata o caso com rigor extremo, investigando a conduta de ambas as profissionais sob a ótica do homicídio doloso qualificado.
O delegado Marcelo Martins afirmou categoricamente que a morte foi causada por uma “overdose de adrenalina”, descartando outras hipóteses clínicas para o óbito.
Um ponto crucial da investigação é a descoberta de que a médica tentou alterar o prontuário eletrônico após a morte da criança.
Testemunhas relataram que ela acessou o sistema para apagar a indicação de “via endovenosa”, tentando encobrir o erro grosseiro cometido na prescrição.
Além disso, prints de conversas de WhatsApp mostram a médica pedindo ajuda a colegas e confessando: “Errei a prescrição, pelo amor de Deus”.
Essa confissão informal contradiz a tese da defesa de que houve um “bug” no software do hospital que alterou a via de administração.
A perícia técnica no sistema do Hospital Santa Júlia está sendo realizada para comprovar se houve ou não a falha alegada pela defesa.
Entretanto, o delegado adianta que análises preliminares não indicam qualquer defeito no sistema que justificasse a troca automática da via de medicação.
A técnica de enfermagem, por sua vez, alega que estava sozinha e sobrecarregada, e que apenas cumpriu o que estava escrito na tela.
Por outro lado, a quebra do protocolo de “dupla checagem” é apontada como uma falha sistêmica grave que contribuiu decisivamente para a tragédia.
Desdobramento Judicial Caso
Com a revogação do Habeas Corpus, a defesa da médica Juliana Brasil terá que traçar novas estratégias para evitar uma possível prisão preventiva imediata.
O Ministério Público do Amazonas acompanha o inquérito de perto e deve oferecer a denúncia assim que a polícia concluir o relatório final.
A sociedade manauara exige uma resposta rápida, visto que casos de erro médico muitas vezes se arrastam por anos sem punição efetiva dos culpados.
O Conselho Regional de Medicina do Amazonas (Cremam) abriu um processo ético sigiloso para apurar a conduta profissional da médica envolvida no caso.
Simultaneamente, o Conselho Regional de Enfermagem (Coren-AM) também investiga a atuação da técnica, tendo suspendido seu registro profissional preventivamente para proteger a sociedade.
O Hospital Santa Júlia, um dos mais tradicionais de Manaus, enfrenta uma crise de imagem sem precedentes e promete colaborar irrestritamente com as autoridades.
A instituição afirmou que revisou seus protocolos internos de segurança do paciente para evitar que novas tragédias como essa voltem a acontecer.
Para a família de Benício, nenhuma punição trará o menino de volta, mas a justiça serve como um alento e um legado necessário.
O caso levantou um debate nacional sobre a qualidade do ensino médico e a sobrecarga de trabalho dos profissionais de saúde no Brasil.
Além disso, a discussão sobre a responsabilidade hierárquica entre médicos e enfermeiros ganhou novos contornos jurídicos com as decisões recentes do tribunal amazonense.
A expectativa agora gira em torno dos próximos passos do delegado Marcelo Martins, que pode indiciar as profissionais por homicídio com dolo eventual.
Se condenadas, as penas podem ser severas, refletindo a gravidade de uma vida interrompida precocemente por uma sucessão de falhas humanas evitáveis.
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