Bacellar alertou TH Joias sobre provas: Freezer, caminhão e plano de fuga

Presidente da Alerj, Rodrigo Bacellar, orientou aliado a esvaziar a casa antes da chegada da PF, conversas interceptadas mostram plano para salvar bens e evitar prisão.

Ex-deputado estadual TH Joias, vestindo terno cinza e gravata azul, sorrindo em foto oficial com bandeira do Brasil ao fundo.
O ex-deputado TH Joias, alvo da Polícia Federal, que teria sido alertado por Rodrigo Bacellar para ocultar provas antes da operação.

A prisão do presidente da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj), Rodrigo Bacellar (União Brasil), ocorrida nesta quarta-feira (3), expôs as entranhas de uma relação perigosa entre a cúpula da política fluminense e investigados por ligação com o crime organizado. Detalhes inéditos da investigação da Polícia Federal (PF), que fundamentaram a ordem de prisão expedida pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Tribunal Federal (STF), revelam que Bacellar não apenas sabia da “Operação Zargun”, deflagrada em setembro contra o ex-deputado TH Joias, mas atuou ativamente para blindar o aliado. O ponto central da acusação é que o parlamentar alertou TH Joias sobre a iminência da ação policial, orientando-o a limpar o cenário antes da chegada dos agentes.

Aviso sobre a operação

As mensagens interceptadas pela PF desenham um quadro de obstrução de justiça flagrante. Segundo o inquérito, Bacellar utilizou sua influência e acesso privilegiado a informações de inteligência para antecipar os passos da polícia. Em uma troca de mensagens recuperada no celular novo de TH Joias — que, num descuido fatal, manteve o histórico de conversas do aparelho antigo —, o presidente da Alerj instruiu o colega a esvaziar sua residência imediatamente. A orientação era clara: eliminar qualquer material que pudesse servir como prova ou incriminar o grupo. Essa “consultoria do crime” permitiu que TH Joias ganhasse tempo precioso para desarticular parte das evidências que seriam apreendidas.

O nível de intimidade e a urgência do diálogo impressionaram os investigadores. TH Joias, demonstrando nervosismo com a possibilidade de perder seus bens, chegou a enviar vídeos para Bacellar perguntando se poderia guardar alguns pertences pessoais na casa de terceiros ou em locais seguros indicados pelo presidente da Alerj. A resposta de Bacellar, capturada nas mensagens, mistura pragmatismo com impaciência, ordenando que o foco fosse a fuga e a limpeza do local, e não o apego material. Esse vazamento frustrou parcialmente os objetivos da operação original, obrigando a PF a deflagrar agora a “Operação Unha e Carne” para prender o próprio vazador.

Comunicado de emergência

Um dos trechos mais insólitos da conversa envolve a preocupação de TH Joias com um freezer lotado de carnes nobres. O ex-deputado, temendo que os policiais “roubassem” ou apreendessem seu estoque de comida de alto padrão, questionou Bacellar sobre o que fazer com o eletrodoméstico. A resposta do presidente da Alerj foi direta e reveladora do desespero do momento: “Deixa isso, tá doido? Larga isso aí, seu doido”. O diálogo mostra que, enquanto a polícia montava o cerco para prender um suspeito de armar o Comando Vermelho, a preocupação do alvo estava dividida entre sua liberdade e o churrasco que ficaria para trás.

Além do freezer, a logística da fuga envolveu o uso de um caminhão-baú. Seguindo as diretrizes desse “comunicado de emergência”, TH Joias mobilizou transporte pesado para retirar móveis e objetos de valor de sua casa na calada da noite. Quando os agentes da PF chegaram ao endereço na manhã seguinte, encontraram o imóvel revirado e parcialmente vazio, confirmando que o alvo havia sido avisado com antecedência. A investigação aponta que essa manobra logística só foi possível graças à confirmação de segurança dada por Bacellar de que a operação ocorreria naquele dia específico.

Notificação de risco

A gravidade do caso escala quando se analisa a motivação por trás da proteção. A PF sustenta que Bacellar agiu para proteger um “braço político” do Comando Vermelho dentro da Alerj. TH Joias é acusado de intermediar a compra de armas e equipamentos antidrone para a facção, utilizando sua imunidade e trânsito político para facilitar os negócios ilícitos. Ao emitir a “notificação de risco” para o aliado, Bacellar não estava apenas ajudando um amigo, mas protegendo um esquema que, segundo a Procuradoria-Geral da República, infiltrou o crime organizado nas mais altas esferas do poder estadual.

O ministro Alexandre de Moraes, ao decretar a prisão preventiva, destacou a “gravíssima infiltração” e o uso do cargo público para finalidades criminosas. A decisão ressalta que a conduta de Bacellar ao vazar a operação coloca em risco a eficácia de todo o sistema de segurança pública do Rio de Janeiro. Se o chefe do Legislativo atua como informante de investigados, nenhuma operação policial é segura. A prisão de Bacellar, realizada dentro de seu gabinete na Alerj ou na sede da PF (conforme versões de apresentação espontânea), marca um ponto de ruptura na política fluminense, atingindo o coração da base de apoio do governador Cláudio Castro.

Alerta de investigação

O desfecho desta quarta-feira cria um vácuo de poder no Rio. Com o presidente da Assembleia preso e afastado, e com provas robustas — incluindo a confissão involuntária nas mensagens de texto —, a defesa de Bacellar enfrenta uma batalha difícil. O “alerta de investigação” que ele tentou dar a TH Joias acabou se tornando a prova cabal de sua própria cumplicidade. O episódio do freezer e do caminhão entra para o anedotário da corrupção brasileira como o símbolo de uma classe política que, mesmo diante da prisão, tenta salvar até a última picanha.

Portanto, a sociedade aguarda os próximos passos. A delação de outros envolvidos ou a abertura de novos arquivos no celular de Bacellar podem implicar ainda mais figuras poderosas. O recado do STF foi dado: a imunidade parlamentar não serve de escudo para transformar gabinetes oficiais em torres de vigia para o crime organizado. O Rio de Janeiro, acostumado a ver seus governantes atrás das grades, assiste a mais um capítulo onde a linha entre a lei e o crime foi completamente apagada por uma mensagem de WhatsApp.

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