O deputado estadual e presidente da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (ALERJ), Rodrigo Bacellar (União Brasil), deixou a sede da Superintendência da Polícia Federal, na Praça Mauá, na noite desta terça-feira (9). A saída do parlamentar ocorre pouco mais de 24 horas após o plenário da Casa Legislativa aprovar, por ampla maioria, a revogação de sua prisão preventiva. Bacellar estava detido desde o dia 3 de dezembro, alvo da Operação “Unha e Carne”, deflagrada por ordem do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF).
A movimentação na porta da Polícia Federal foi intensa, com advogados e assessores aguardando os trâmites finais do alvará de soltura. A liberação marca o capítulo mais recente de uma crise institucional que coloca frente a frente o Judiciário e o Legislativo fluminense. A prisão havia sido decretada sob a suspeita de que Bacellar teria vazado informações privilegiadas sobre a “Operação Zargun” para o ex-deputado TH Joias, supostamente ligado à facção criminosa Comando Vermelho.
Liberdade do parlamentar
A saída de Rodrigo Bacellar não encerra as investigações, mas devolve ao cenário político do Rio de Janeiro sua figura central. A decisão de soltura baseou-se no artigo 53 da Constituição Federal, que confere às casas legislativas o poder de revisar prisões de parlamentares no exercício do mandato. A votação que garantiu a liberdade de Bacellar foi expressiva: 42 deputados votaram a favor da revogação da medida cautelar, enquanto 21 foram contra, além de duas abstenções.
A defesa do deputado sustentou, desde o início, que a prisão era desnecessária e arbitrária. Segundo os advogados, Bacellar sempre esteve à disposição das autoridades e não representava risco à ordem pública ou à instrução criminal. No entanto, a Polícia Federal argumentou que a manutenção do presidente da ALERJ em liberdade poderia comprometer a coleta de provas, dada a sua influência política e a gravidade das acusações de interferência em inquéritos sigilosos envolvendo o crime organizado.
Revogação da custódia
O processo que culminou na saída de Bacellar da carceragem da PF envolveu intensas articulações nos bastidores da ALERJ. A sessão que deliberou sobre a soltura foi marcada por discursos inflamados sobre a autonomia do Parlamento estadual frente às decisões monocráticas do STF. Deputados aliados argumentaram que a prisão preventiva, sem condenação definitiva, feria as prerrogativas do mandato conferido pelo voto popular.
Por outro lado, a oposição criticou duramente a celeridade com que a Casa agiu para blindar seu presidente. Parlamentares contrários à soltura lembraram que as evidências apresentadas pela Procuradoria-Geral da República (PGR) eram robustas. Entre as provas citadas estariam trocas de mensagens e registros telefônicos que indicariam, segundo a PF, o alerta dado por Bacellar a TH Joias horas antes da operação que visava prender o aliado. A revogação da custódia, portanto, é vista por críticos como um movimento de autoproteção corporativista.
Acusações de obstrução
O inquérito que levou Rodrigo Bacellar à prisão detalha uma suposta rede de proteção a figuras ligadas ao tráfico de drogas dentro da política fluminense. A Operação “Unha e Carne” investiga se o presidente da ALERJ utilizou seu cargo e seus contatos para blindar TH Joias, acusado de ser o elo entre o poder público e o Comando Vermelho. A PF afirma que Bacellar teria orientado o ex-deputado a se desfazer de provas e a fugir antes da chegada dos agentes federais em setembro.
Um dos pontos mais sensíveis da investigação refere-se à interceptação de diálogos onde Bacellar supostamente discute a operação policial iminente. Para o ministro Alexandre de Moraes, essas condutas configuram obstrução de justiça e atentado contra o Estado de Direito. A gravidade reside na suspeita de que a estrutura do Estado estaria sendo usada para fortalecer facções criminosas em troca de “milhões de votos” em áreas dominadas pelo tráfico, conforme apontado nos relatórios da inteligência federal.
Imbróglio jurídico-político
A soltura de Bacellar abre um precedente perigoso e reacende o debate sobre os limites da imunidade parlamentar. Embora a Constituição garanta que deputados só possam ser presos em flagrante de crime inafiançável, a interpretação do STF em casos recentes tem sido mais rigorosa. A decisão da ALERJ de derrubar a ordem de Moraes pode gerar uma nova reação do Supremo, que ainda analisará a validade do ato legislativo estadual frente aos indícios de crimes comuns.
O cenário político no Rio de Janeiro, historicamente marcado por prisões de ex-governadores e presidentes da Assembleia, vive agora um momento de tensão máxima. O retorno de Bacellar à presidência da Casa, embora legalmente amparado pela votação dos pares, ocorre sob a sombra de uma investigação federal em curso. A sociedade civil e entidades de transparência observam com cautela os desdobramentos, temendo que a normalização institucional mascare a gravidade das denúncias de infiltração do crime organizado nas esferas de poder.
