PF combate desvio combustível aviação garimpo Roraima

Operação deflagrada nesta segunda-feira desarticulou esquema que operou entre 2022 e 2023 usando empresas de fachada para abastecer aeronaves do garimpo ilegal Yanomami

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Agente da Polícia Federal em operação contra garimpo ilegal em Roraima com estruturas ao fundo
Agente da Polícia Federal atua em operação de combate ao desvio de combustível de aviação destinado ao garimpo ilegal na Terra Indígena Yanomami

A Polícia Federal realizou nesta segunda-feira (24) uma operação para desarticular um esquema criminoso que, entre 2022 e 2023, comprava e transportava combustível de aviação destinado a abastecer aeronaves utilizadas na logística do garimpo ilegal na Terra Indígena Yanomami. A investigação revelou que empresas de fachada e locais de abastecimento falsos eram usados para dar aparência de legalidade à aquisição e ao transporte do combustível.

Durante a operação, foram cumpridos três mandados de busca e apreensão em Roraima e no Tocantins. Além disso, a Justiça determinou o bloqueio de bens que pode chegar a R$ 20 milhões. As investigações apontam que as práticas fraudulentas foram confirmadas por diversos elementos, incluindo a falta de estrutura adequada nos supostos locais de abastecimento e a ausência de aeronaves autorizadas a voar nos endereços informados.

Esquema de empresas fantasmas

A investigação da Polícia Federal identificou que o grupo criminoso montou uma rede complexa de empresas de fachada e pontos de abastecimento falsos para simular operações legítimas. O objetivo era mascarar a real destinação do combustível, que servia exclusivamente para abastecer as aeronaves que transportavam insumos, equipamentos e pessoas para as áreas de garimpo ilegal dentro do território Yanomami.

Os policiais constataram que os locais indicados como postos de abastecimento não possuíam qualquer estrutura compatível com esse tipo de serviço. Não havia instalações adequadas para armazenamento de combustível de aviação, tampouco equipamentos de segurança exigidos pela legislação para esse tipo de operação. A precariedade da infraestrutura evidenciava o caráter fraudulento das operações.

Volume incompatível com atividades legais

Um dos principais indícios do esquema criminoso foi a quantidade de combustível adquirida pelos investigados. O volume era muito superior ao que seria justificável para qualquer atividade legal. Ainda mais suspeito era o fato de que não havia aeronaves autorizadas a operar nos endereços informados, tornando impossível qualquer uso legítimo do combustível adquirido.

A compra sistemática de grandes quantidades de combustível de aviação sem destinação aparente chamou a atenção das autoridades. Os investigadores cruzaram informações sobre as compras realizadas com os registros de aeronaves autorizadas, constatando total incompatibilidade entre o volume adquirido e as possíveis necessidades das aeronaves regularmente cadastradas na região.

Logística do garimpo ilegal

O combustível desviado era essencial para manter a logística do garimpo ilegal na Terra Indígena Yanomami. As aeronaves abastecidas com esse combustível realizavam voos clandestinos transportando alimentos, ferramentas, maquinário pesado e pessoas para as áreas de extração mineral. Além disso, essas mesmas aeronaves eram utilizadas para retirar o ouro extraído ilegalmente do território indígena.

A operação aérea clandestina representa um dos pilares fundamentais para a manutenção da atividade garimpeira ilegal. Sem o abastecimento regular de combustível, as aeronaves não conseguiriam manter os voos necessários para suprir os garimpeiros com os insumos básicos para suas atividades. Por isso, o combate ao desvio de combustível é considerado estratégico no enfrentamento ao garimpo ilegal.

Operações anteriores contra combustível desviado

Esta não é a primeira operação da Polícia Federal contra esquemas de fornecimento ilegal de combustível de aviação para o garimpo na Terra Indígena Yanomami. Em maio deste ano, a PF deflagrou a Operação AVGAS, que também teve como objetivo desarticular um esquema criminoso similar.

Na Operação AVGAS, foram cumpridos dez mandados de busca e apreensão, sendo dois deles em São Paulo. Aquela ação resultou no bloqueio de valores e sequestro de bens no montante aproximado de R$ 16 milhões. Os investigados naquela operação eram pilotos, pessoas físicas e jurídicas associadas ao garimpo que adquiriam e forneciam expressivas quantidades de combustível de aviação.

Crimes investigados e penas previstas

Os envolvidos no esquema desarticulado nesta segunda-feira poderão responder por diversos crimes previstos na legislação brasileira. Entre as acusações estão associação criminosa, comércio irregular de combustível, usurpação de bens da União, falsidade ideológica e lavagem de dinheiro.

A associação criminosa está prevista no Código Penal e se configura quando três ou mais pessoas se associam de forma estável para cometer crimes. O comércio irregular de combustível é tipificado em legislação específica que regula o setor de petróleo e derivados. Já a usurpação de bens da União refere-se à exploração ilegal de recursos minerais em terras públicas federais, como é o caso das terras indígenas.

Contexto do garimpo ilegal Yanomami

A Terra Indígena Yanomami é uma das maiores áreas protegidas do Brasil, com aproximadamente 9,6 milhões de hectares localizados entre os estados de Roraima e Amazonas. A região abriga cerca de 30 mil indígenas, mas enfrenta há décadas o problema da invasão por garimpeiros ilegais que buscam explorar ouro e outros minerais.

O garimpo ilegal na região intensificou-se nos últimos anos, causando graves impactos ambientais e sanitários. A contaminação dos rios por mercúrio utilizado na extração de ouro, o desmatamento, a abertura de pistas clandestinas e a disseminação de doenças entre as comunidades indígenas são algumas das consequências devastadoras da atividade criminosa.

Operações integradas de combate

O Governo Federal tem mantido operações permanentes de combate ao garimpo ilegal na Terra Indígena Yanomami. Desde a abertura da Casa de Governo em Roraima, em março de 2024, foram realizadas mais de 7.600 ações integradas na região. Os números oficiais mostram a dimensão do trabalho: 34 aeronaves foram inutilizadas, oito apreendidas e 62 pistas clandestinas destruídas.

As operações já impuseram mais de R$ 511,6 milhões em prejuízo ao garimpo ilegal, comprometendo financeiramente a rede criminosa que atua no território. A Operação Asfixia, realizada entre junho e julho deste ano, foi uma das mais significativas, resultando na destruição de mais de 100 estruturas e na retirada de circulação de aproximadamente 4 mil litros de combustível.

Participação de múltiplos órgãos

O combate ao garimpo ilegal na Terra Indígena Yanomami envolve a atuação coordenada de diversos órgãos federais. Além da Polícia Federal, participam das operações a Força Nacional de Segurança Pública, Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), Polícia Rodoviária Federal, Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC), Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) e Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama).

A Força Aérea Brasileira também tem papel fundamental através da Operação Ostium, que realiza o monitoramento e a interceptação de aeronaves que sobrevoam a região sem plano de voo. Em junho, um caça A-29 Super Tucano interceptou uma aeronave que transportava cassiterita extraída ilegalmente. O piloto realizou um pouso forçado em área de mata fechada na tentativa de fugir, mas foi localizado e entregue à Polícia Federal.

Rotas clandestinas e pontos estratégicos

As investigações identificaram que o esquema utilizava rotas clandestinas específicas para o transporte do combustível desviado. A região do Apiáu, zona rural de Roraima, é considerada área estratégica para essas rotas que abastecem o garimpo com combustível, mercadorias e maquinário. Outras áreas monitoradas incluem as vilas de Samaúma e Campos Novos, onde há indícios de suporte logístico ao garimpo.

As autoridades intensificaram as fiscalizações em pistas e aeródromos suspeitos nessas localidades. A atuação da ANAC resultou na inspeção de 33 aeronaves e em vistorias em pistas não homologadas, muitas com sinais de uso recente ou tentativas de reativação. O bloqueio do rio Couto Magalhães também foi realizado com o objetivo de interromper uma das principais rotas de abastecimento fluvial utilizadas pelos invasores.

Impactos da repressão

Segundo avaliação da área de inteligência do Centro Gestor e Operacional do Sistema de Proteção da Amazônia (CENSIPAM), as operações de destruição de aeronaves e a presença operacional intensa na região afetaram drasticamente a logística aérea do garimpo ilegal. Os voos que partiam da região da Vila Samaúma foram especialmente impactados pelas ações de fiscalização e repressão.

O diretor da Casa de Governo, Nilton Tubino, avaliou que as operações cumpriram seu papel ao desmontar a estrutura logística do garimpo. Entretanto, ele ressaltou que a missão continua: manter a pressão sobre os criminosos, impedir o retorno dos invasores e garantir a preservação do território Yanomami. Para a Casa de Governo, os resultados confirmam que ações com presença permanente são as que geram maior impacto operacional.

Perspectivas e continuidade das ações

Com o encerramento da ADPF 709 no Supremo Tribunal Federal, o Governo Federal reforçou que as ações de proteção e combate ao garimpo na Terra Indígena Yanomami não serão interrompidas. As operações seguem com plano de manutenção permanente, garantindo vigilância contínua, presença das forças de segurança e continuidade das ações humanitárias e ambientais.

Os órgãos envolvidos já preparam novas fases de combate, com foco no uso de tecnologia de monitoramento, repressão financeira às redes criminosas e presença permanente em pontos estratégicos. A expectativa é consolidar de forma definitiva a desintrusão da Terra Indígena Yanomami, mantendo as áreas livres de qualquer reocupação garimpeira e protegendo os direitos dos povos indígenas que habitam o território.

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