EUA impõem sanções a seis petroleiros da Venezuela em nova asfixia econômica

Departamento do Tesouro mira “frota fantasma” e familiares do presidente venezuelano; medida ocorre 24 horas após apreensão inédita de superpetroleiro no Caribe.

Vista aérea de terminal de petróleo costeiro com grandes tanques de armazenamento brancos e um navio petroleiro atracado, ilustrando a infraestrutura de exportação alvo de sanções.
Complexo de armazenamento e carregamento de petróleo; EUA sancionaram seis transportadoras e a "frota fantasma" utilizada pela Venezuela para tentar contornar o bloqueio econômico. (Foto: Reprodução/Redes Sociais)

O governo dos Estados Unidos, sob a administração de Donald Trump, anunciou nesta sexta-feira (12) um novo e severo pacote de punições contra a infraestrutura de exportação da Venezuela, sancionando diretamente seis grandes transportadoras de petróleo e empresas de navegação ligadas à estatal PDVSA. A medida, oficializada pelo Escritório de Controle de Ativos Estrangeiros (OFAC) do Departamento do Tesouro, visa desmantelar a rede logística que permite ao governo de Nicolás Maduro contornar as restrições internacionais e manter o fluxo de caixa através da venda de óleo cru para mercados asiáticos. Imediatamente após a divulgação da lista negra, o mercado global de energia reagiu com volatilidade, temendo uma redução na oferta e um aumento nas tensões navais no Caribe.

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Entre os alvos principais estão seis superpetroleiros do tipo VLCC (Very Large Crude Carriers), incluindo embarcações como o White Crane, Kiara M e H. Constance, que operam sob bandeiras de conveniência como Panamá, Ilhas Cook e Hong Kong. Segundo o Tesouro americano, esses navios têm adotado “práticas de navegação enganosas e inseguras”, como o desligamento de transponders (sistemas de identificação automática) para navegar como navios fantasmas e ocultar a origem venezuelana da carga. A ação congela quaisquer ativos dessas empresas nos EUA e proíbe cidadãos ou entidades americanas de realizar transações com elas, efetivamente isolando-as do sistema financeiro ocidental.

Bloqueio financeiro atinge círculo íntimo de Maduro

O bloqueio financeiro imposto nesta sexta-feira não se limitou apenas às máquinas de transporte, mas atingiu em cheio o núcleo familiar do presidente venezuelano. A lista da OFAC incluiu novamente três sobrinhos da primeira-dama Cilia Flores: Franqui Francisco Flores de Freitas, Efrain Antonio Campo Flores e Carlos Erik Malpica Flores. Conhecidos infamemente como os “narco-sobrinhos”, Franqui e Efrain já haviam sido condenados por tráfico de drogas nos EUA em 2016 e liberados em uma troca de prisioneiros em 2022 durante a administração Biden, mas agora voltam a ser alvo de asfixia patrimonial sob a acusação de continuarem operando esquemas ilícitos de financiamento para o regime.

Além disso, o Tesouro sancionou o empresário panamenho Ramon Carretero Napolitano, apontado como um operador chave na facilitação dessas remessas de petróleo clandestinas. A estratégia de Washington é clara: tornar o custo de fazer negócios com a Venezuela proibitivo para intermediários internacionais. Ao perseguir não apenas o Estado venezuelano, mas os indivíduos e as empresas de fachada que lubrificam essa engrenagem, Trump busca criar um efeito de paralisia, onde seguradoras, portos e compradores cancelem contratos por medo de represálias secundárias.

Embargo logístico e a “frota fantasma”

O embargo logístico foca especificamente na chamada “frota fantasma” ou “dark fleet”, um conjunto de navios envelhecidos e com propriedade opaca que a Venezuela, assim como o Irã e a Rússia, utiliza para exportar commodities sancionadas. As embarcações listadas — White Crane, Kiara M, H. Constance, Lattafa, Tamia e Monique — são peças centrais nesse tabuleiro. De acordo com dados de rastreamento da Windward AI, citados por especialistas, o navio Tamia, por exemplo, desacelerou e parou misteriosamente fora da Cidade do Cabo logo após o anúncio das sanções, indicando que a pressão americana já está causando disrupção em tempo real nas rotas marítimas.

Sobretudo, a justificativa técnica para as sanções baseia-se na segurança ambiental e marítima. O Departamento de Estado argumenta que esses navios, ao desligarem seus radares e realizarem transferências de carga em alto mar (ship-to-ship) para ocultar a origem do petróleo, representam um perigo iminente de desastres ecológicos no Caribe e no Atlântico. Essa narrativa fornece uma camada de legitimidade técnica para uma ação que é, em sua essência, geopolítica e de guerra econômica, permitindo que os EUA pressionem também a Organização Marítima Internacional (IMO) e bandeiras de registro como a do Panamá a cassarem as licenças dessas embarcações.

Ofensiva econômica após apreensão inédita

Esta nova ofensiva econômica ocorre num contexto de escalada militar sem precedentes recentes. Apenas 24 horas antes das sanções, a Guarda Costeira dos EUA, apoiada pelo FBI, realizou a apreensão física do superpetroleiro Skipper (anteriormente conhecido como Adisa) em águas internacionais, alegando que ele transportava petróleo ligado à Guarda Revolucionária do Irã e ao Hezbollah, além da PDVSA. A captura do navio e de sua carga de 1,8 milhão de barris foi classificada por Maduro como um ato de “pirataria internacional” e “roubo”, mas foi celebrada por Trump como uma vitória na luta contra o narcoterrorismo.

Consequentemente, a mensagem enviada por Washington é que a imunidade em águas internacionais acabou para navios que servem a regimes sancionados. O Secretário do Tesouro, Scott Bessent, declarou explicitamente que as sanções visam desfazer o que chamou de “tentativa falha da administração anterior de fazer acordos com Maduro”, sinalizando uma política de tolerância zero. Analistas apontam que a combinação de sanções financeiras (OFAC) com interdições físicas (Guarda Costeira) cria um cenário de bloqueio naval de facto, forçando a Venezuela a vender seu petróleo com descontos ainda maiores, erodindo a receita necessária para importar alimentos e remédios.

Cerco comercial e impacto regional

O cerco comercial desenhado pelos EUA coloca os países vizinhos, especialmente o Brasil e a Guiana, em uma posição delicada. O Brasil, que compartilha fronteira com a Venezuela, observa com preocupação o potencial de desestabilização econômica que pode gerar novos fluxos migratórios. Se a PDVSA colapsar totalmente sob o peso dessas sanções e apreensões, a crise humanitária na fronteira de Roraima tende a se agravar. Além disso, a retórica de Trump sobre “ataques por terra” para combater o tráfico, combinada com o estrangulamento do petróleo, sugere que a Casa Branca vê a economia venezuelana como um alvo militar legítimo.

Entretanto, a eficácia a longo prazo dessas medidas é debatida. A Venezuela, com apoio da China e da Rússia, tem demonstrado resiliência em adaptar suas rotas de contrabando. A China, destino final de grande parte desse óleo, geralmente utiliza refinarias independentes (“teapots”) que não têm exposição ao sistema financeiro americano, mitigando parte do impacto. Ainda assim, a agressividade da administração Trump em 2025, disposta a abordar navios fisicamente, introduz um risco físico que transportadores chineses ou russos podem não estar dispostos a correr sem garantias de proteção naval de seus próprios governos, elevando o risco de um incidente internacional de grandes proporções.

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