Fundo da Noruega desafia Microsoft e exige relatório de direitos humanos

Com US$ 50 bilhões investidos na empresa, gigante norueguês votará contra a recomendação do conselho e também se opõe aos super-salários e acúmulo de cargos do CEO Satya Nadella.

Placa com o logotipo da Microsoft em frente à sede corporativa da empresa, ilustrando o cenário de pressão por parte do fundo soberano da Noruega na próxima assembleia de acionistas.
Fachada da Microsoft: Fundo soberano da Noruega, dono de US$ 50 bilhões em ações da empresa, desafia a diretoria e exige transparência sobre direitos humanos e revisão de salários.

O Norges Bank Investment Management (NBIM), gestor do fundo soberano da Noruega e maior investidor estatal do planeta, anunciou neste domingo (30) que adotará uma postura combativa na próxima assembleia anual de acionistas da Microsoft, agendada para o início de dezembro. A entidade, que detém uma participação de 1,35% na gigante de tecnologia — equivalente a cerca de US$ 50 bilhões —, declarou que votará a favor de uma proposta de acionistas que exige um relatório detalhado sobre os riscos de operar em países com preocupações significativas em relação aos direitos humanos. A decisão coloca o fundo em rota de colisão direta com a diretoria da Microsoft, que recomendou formalmente a rejeição da medida.

A postura do fundo norueguês não é um ato isolado, mas reflete uma diretriz crescente de responsabilizar grandes corporações pelos impactos sociais de seus produtos e parcerias globais. Em comunicado divulgado em seu site oficial, o NBIM justificou o voto afirmando que “o conselho deve prestar contas sobre os riscos materiais de sustentabilidade que a empresa enfrenta e as consequências sociais e ambientais mais amplas de suas operações”. Para o fundo, a transparência não é apenas uma questão moral, mas um imperativo para a gestão de riscos a longo prazo, especialmente quando envolve tecnologias sensíveis como inteligência artificial e vigilância em regimes autoritários.

Voto contra a cúpula e salários

Além da pauta de direitos humanos, o fundo soberano da Noruega sinalizou que votará contra a reeleição de Satya Nadella para o cargo de presidente do conselho (chairman), mantendo sua política histórica de exigir a separação entre os cargos de CEO e presidente do conselho para garantir melhor governança e fiscalização independente. O NBIM também se oporá ao pacote de remuneração proposto para os executivos, reiterando sua crítica frequente aos salários excessivos praticados no mercado norte-americano, que muitas vezes não se alinham à criação de valor sustentável para os acionistas a longo prazo.

Essa movimentação é significativa porque o fundo norueguês é frequentemente visto como um “farol” para outros investidores institucionais. Quando o NBIM se posiciona publicamente cinco dias antes da votação, ele envia um sinal claro ao mercado. Embora o voto sobre remuneração (“say-on-pay”) seja consultivo e a proposta de direitos humanos não seja vinculante mesmo se aprovada, o apoio de um acionista com o peso de US$ 2 trilhões gera um constrangimento político e reputacional que a Microsoft dificilmente poderá ignorar sem dar explicações robustas aos seus stakeholders.

Direitos humanos na era da IA

A proposta apoiada pelo fundo toca em um nervo exposto das Big Techs: a contradição entre discursos de empoderamento e a venda de tecnologias para governos que violam liberdades civis. Investidores preocupados com ESG (sigla em inglês para critérios ambientais, sociais e de governança) temem que as ferramentas da Microsoft possam ser utilizadas para censura ou perseguição em países onde a empresa mantém data centers ou contratos governamentais. Ao exigir um relatório de riscos, os acionistas buscam garantir que a empresa tenha processos de “due diligence” (diligência prévia) robustos o suficiente para evitar cumplicidade em abusos, protegendo assim a marca e o valor das ações contra escândalos futuros.

A resposta da Microsoft até o momento tem sido de que seus relatórios atuais e políticas internas já cobrem essas preocupações, tornando a proposta dos acionistas “desnecessária”. No entanto, a adesão do fundo norueguês sugere que os investidores não estão convencidos apenas com as promessas de autorregulação. O episódio reforça a tendência de que a próxima fronteira da responsabilidade corporativa não será apenas sobre emissões de carbono, mas sobre a ética algorítmica e a geopolítica dos dados, áreas onde a Microsoft é um player central.

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