As imagens de cartão-postal das Ilhas Baleares, famosas mundialmente por suas praias de águas turquesas e verões ensolarados, deram lugar a um cenário desolador e branco nas últimas 24 horas. No entanto, não se tratava de neve, mas de uma tempestade de granizo de proporções bíblicas que castigou severamente a ilha de Maiorca. O fenômeno meteorológico, inesperado pela sua violência e duração, transformou campos férteis em tapetes de gelo, provocando uma destruição maciça nas zonas rurais. Agricultores locais, que se preparavam para a colheita da temporada de inverno, assistiram impotentes enquanto o trabalho de meses era triturado em questão de minutos pela fúria da natureza.
O impacto foi sentido com maior intensidade nas regiões centrais e norte da ilha, áreas tradicionalmente dedicadas ao cultivo de hortaliças e vegetais. Segundo relatos preliminares das associações agrárias locais, a tempestade não apenas danificou as folhas e frutos, mas em muitos casos comprometeu a estrutura das plantas, inviabilizando qualquer tentativa de recuperação. O evento levanta, mais uma vez, o debate sobre as mudanças climáticas no Mediterrâneo, que tem se tornado um “hotspot” para fenômenos extremos, alternando secas severas com tempestades devastadoras que colocam em xeque a segurança alimentar da região.
O massacre do gelo na agricultura
A zona de Sa Pobla, conhecida pela sua extensa produção de batatas e vegetais de folha, foi o epicentro do desastre agrícola. O que se vê nos campos é um cenário de terra arrasada. Plantações de alface, repolho, acelga e batata, que abastecem tanto o mercado local quanto parte do continente europeu, foram completamente perfuradas ou esmagadas pelo peso e impacto das pedras de gelo. Agricultores descrevem o som da tempestade como um bombardeio contínuo, capaz de rasgar estufas plásticas e destruir infraestruturas de proteção que deveriam resguardar as culturas mais sensíveis.
Além dos danos diretos às plantas, o acúmulo de gelo no solo provocou um resfriamento abrupto da terra, o que pode queimar as raízes e impedir o crescimento de qualquer remanescente da safra. Técnicos agrícolas explicam que o choque térmico é tão prejudicial quanto o impacto físico do granizo. Para culturas sensíveis como as de hortaliças, esse tipo de evento representa perda total imediata. O setor, que já vinha lutando contra o aumento dos custos de produção e a escassez de água nos meses anteriores, agora enfrenta um golpe financeiro que pode levar pequenos produtores à falência se não houver intervenção estatal rápida.
Prejuízos incalculáveis nas colheitas
Ainda é cedo para fechar a conta final, mas as primeiras estimativas das cooperativas agrícolas de Maiorca apontam para prejuízos na casa dos milhões de euros. A tempestade atingiu a ilha em um momento crítico do calendário agrícola, justamente quando muitas culturas de inverno estavam prontas para a colheita ou em pleno desenvolvimento vegetativo. A perda dessas safras não significa apenas um prejuízo direto para o agricultor, mas também uma quebra na cadeia de suprimentos que abastece hotéis, restaurantes e supermercados das Baleares e do sul da Espanha.
A preocupação se estende para além das fronteiras da ilha. A Espanha é frequentemente chamada de “a horta da Europa” durante os meses frios, fornecendo vegetais frescos para países como Alemanha, Reino Unido e França. Embora Maiorca não tenha o mesmo volume de exportação que a região de Almería ou Múrcia, a quebra de safra local pressiona o mercado interno espanhol, o que pode, por efeito dominó, elevar os preços dos alimentos frescos nas prateleiras nas próximas semanas. A escassez repentina de produtos básicos como batata e verduras obriga os distribuidores a buscarem fornecedores alternativos, muitas vezes a custos mais elevados, repassando a alta para o consumidor final.
Tempestade arrasa produção rural
O fenômeno que atingiu Maiorca não foi isolado, mas parte de um sistema de instabilidade que varreu o Mediterrâneo Ocidental. Meteorologistas apontam para a formação de uma DANA (Depressão Isolada em Níveis Altos), comum nesta época do ano, mas que tem se apresentado com energia extra devido às temperaturas da superfície do mar, que permanecem acima da média histórica. Essa energia térmica disponível atua como combustível para as nuvens de tempestade, permitindo que elas cresçam verticalmente e formem granizo de grande calibre, além de ventos fortes e chuvas torrenciais concentradas em curtos períodos de tempo.
A infraestrutura rural também sofreu danos consideráveis. Além das plantações a céu aberto, instalações como armazéns, sistemas de irrigação e maquinário foram afetados. Telhados de fibrocimento foram perfurados e canais de drenagem transbordaram, alagando campos e dificultando o acesso às áreas mais remotas para a avaliação dos danos. O cenário é de caos logístico, com estradas rurais bloqueadas por lama e gelo, impedindo que os seguros agrícolas cheguem aos locais para as vistorias necessárias. A comunidade rural pede agilidade na declaração de zona catastrófica, mecanismo que permitiria o acesso a fundos de emergência e isenções fiscais vitais para a sobrevivência do setor.
O cenário desolador pós-granizo
Enquanto o sol volta a aparecer timidamente sobre as Baleares, iluminando o branco do gelo que ainda cobre a terra vermelha característica da ilha, o sentimento é de luto e resiliência. Famílias inteiras que dependem da agricultura percorrem suas terras tentando salvar o que sobrou, mas a realidade é dura: em muitos hectares, não restou nada que possa ser comercializado. A “pedra”, como os agricultores chamam o granizo, não escolhe alvo, atingindo tanto o grande produtor tecnificado quanto a horta familiar de subsistência.
Este evento serve como mais um alerta estridente sobre a vulnerabilidade da agricultura frente às mudanças climáticas. O padrão de chuvas suaves e previsíveis está sendo substituído por eventos extremos e destrutivos. Para o futuro, o setor agrícola de Maiorca e de toda a região do Mediterrâneo terá que repensar suas estratégias, investindo pesadamente em tecnologias de proteção, como malhas antigranizo e estufas reforçadas, ou enfrentar a inviabilidade econômica. Por ora, resta a limpeza dos escombros e a esperança de que a próxima janela de plantio seja mais gentil com aqueles que trabalham para alimentar a população.
A solidariedade entre os vizinhos tem sido o único ponto de luz na escuridão deste desastre. Associações de moradores e outros agricultores menos afetados estão se mobilizando para ajudar na limpeza e na recuperação das propriedades mais atingidas. No entanto, a cicatriz deixada por esta tempestade de novembro de 2025 demorará a sarar, tanto na paisagem física de Maiorca quanto na economia de suas zonas rurais. A “Ilha da Calma” foi sacudida pela tempestade, lembrando a todos que a natureza, em sua beleza e fúria, detém a última palavra.
