Esposa de Moraes: Banco Master pagava R$ 3,6 milhões mensais a escritório

Documentos obtidos pela Polícia Federal no celular do banqueiro Daniel Vorcaro detalham acordo de R$ 129 milhões, instituição financeira assumia encargos fiscais da banca de advocacia.

Duas pessoas posam lado a lado em ambiente formal, uma delas vestindo traje cerimonial escuro e a outra usando vestido vermelho, ambas olhando para a câmera.
Banco Master vínculo citado reacende debate sobre transparência, governança e conduta ética após intervenção e liquidação extrajudicial decretadas pelo Banco Central.

Uma reportagem exclusiva do jornal O Globo revelou, nesta semana, detalhes de um contrato de prestação de serviços advocatícios firmado entre o escritório de Viviane Barci de Moraes, esposa do ministro Alexandre de Moraes, e o Banco Master. Segundo os documentos apreendidos pela Polícia Federal, o acordo previa o pagamento mensal de R$ 3,6 milhões à banca da advogada. O contrato, encontrado no celular do banqueiro Daniel Vorcaro durante a Operação Compliance Zero, estabelecia ainda que todos os impostos incidentes sobre as notas fiscais seriam custeados pela própria instituição financeira, garantindo que o valor chegasse líquido ao escritório.

O montante total do acordo chamou a atenção dos investigadores e da opinião pública. Com validade prevista de três anos, o contrato somaria, ao final do período, cerca de R$ 129 milhões em honorários para o escritório de Viviane Moraes. A descoberta ocorreu no contexto de uma investigação maior sobre supostas fraudes financeiras envolvendo o Banco Master e o Banco de Brasília (BRB), que resultou na prisão temporária de Vorcaro e na apuração de um prejuízo bilionário. A revelação lança luz sobre as conexões entre o alto escalão do judiciário e instituições financeiras sob escrutínio policial.

Acordo financeiro milionário

A cláusula que atribui ao Banco Master a responsabilidade pelo pagamento dos impostos é considerada incomum em contratos de prestação de serviços padrão, onde o prestador geralmente arca com sua carga tributária. De acordo com as informações divulgadas, essa “vantagem” financeira elevava o custo real do contrato para o banco muito além dos R$ 3,6 milhões mensais nominais, demonstrando o alto valor que a instituição atribuía à parceria com a esposa do ministro. O contrato foi assinado em janeiro de 2024 e teria vigência até 2027, coincidindo com o período em que Alexandre de Moraes assumiria a presidência do Supremo Tribunal Federal (STF).

Além disso, a Polícia Federal identificou que os pagamentos ao escritório de Viviane eram tratados como prioridade absoluta dentro do Banco Master. Mensagens interceptadas entre executivos da instituição mostravam ordens expressas de Daniel Vorcaro para que os repasses “não deixassem de ser feitos em hipótese alguma”, sugerindo uma relação estratégica crítica para o banco. Entretanto, com a liquidação extrajudicial do banco decretada e as contas bloqueadas, os pagamentos foram interrompidos antes do cumprimento total do prazo estipulado.

Prestação de serviços advocatícios

O escopo do trabalho contratado, descrito nos documentos, era amplo e, em certos pontos, genérico. O escritório Barci de Moraes deveria representar os interesses do Banco Master “onde fosse necessário”, incluindo atuações perante órgãos como o Banco Central, a Receita Federal e o Congresso Nacional. Especialistas ouvidos pela imprensa apontam que contratos com objetos tão vagos e valores tão expressivos costumam levantar bandeiras vermelhas em auditorias de compliance, especialmente quando envolvem Pessoas Expostas Politicamente (PEPs).

A defesa do Banco Master e do escritório de advocacia sustenta que a contratação seguiu todos os trâmites legais e que os serviços foram efetivamente prestados. Contudo, a ausência de detalhamento sobre quais processos específicos ou causas complexas justificariam um honorário mensal fixo de R$ 3,6 milhões permanece como um ponto de questionamento por parte de órgãos de controle e da sociedade civil. A OAB e outras entidades jurídicas ainda não se manifestaram formalmente sobre a proporcionalidade dos valores praticados neste caso específico.

Vínculo jurídico comercial

A repercussão política do caso é imediata e intensa. Parlamentares da oposição já se mobilizam para cobrar explicações e analisam se o vínculo comercial da esposa do ministro com um banco investigado poderia configurar conflito de interesses, dado o poder de decisão de Alexandre de Moraes em matérias financeiras e penais que tramitam na corte suprema. A ONG Transparência Internacional criticou o contrato, afirmando que situações como essa corroem a confiança na imparcialidade do sistema de justiça brasileiro.

Por outro lado, é importante ressaltar que não há, até o momento, acusação formal de ilegalidade contra Viviane Moraes ou seu escritório no âmbito deste inquérito específico. A advocacia é uma profissão livre e a contratação de parentes de magistrados, embora eticamente debatida, não é proibida pela legislação atual, desde que não haja atuação direta do juiz nos processos do cliente do escritório. O foco da Polícia Federal na Operação Compliance Zero permanece nas supostas fraudes operacionais do Banco Master, sendo o contrato um elemento probatório do fluxo financeiro da instituição.

Pagamentos mensais vultosos

A situação de Daniel Vorcaro, signatário do contrato pelo banco, complicou-se significativamente nas últimas semanas. Acusado de liderar um esquema de desvio de recursos e emissão de títulos sem lastro, o banqueiro tenta responder ao processo em liberdade enquanto seus bens e os da instituição sofrem constrições judiciais. O contrato com o escritório da esposa de Moraes aparece nos autos como uma das muitas despesas extravagantes de uma gestão que, segundo a PF, operava de forma temerária no mercado financeiro.

Portanto, o desdobramento deste caso dependerá da análise minuciosa dos serviços efetivamente entregues em contrapartida aos milhões pagos. Se comprovada a prestação de serviços jurídicos compatíveis com os valores de mercado para bancas de elite, o caso pode se restringir ao debate ético. Caso contrário, se as investigações apontarem para simulação ou tráfico de influência, as consequências jurídicas poderão ser severas para todos os envolvidos. O silêncio do ministro Alexandre de Moraes sobre o tema, até agora, mantém o clima de tensão em Brasília elevado.

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