O Instituto Nacional do Seguro Social suspendeu por tempo indeterminado nesta terça-feira, 2 de dezembro, o recebimento de novas averbações de crédito consignado do Agibank. A decisão fundamenta-se em auditoria da Controladoria-Geral da União que identificou série extensa de irregularidades e práticas lesivas aos beneficiários da previdência social. Entre achados mais graves constam 1.192 contratos assinados após data de óbito dos beneficiários titulares entre 2023 e 2025, configurando prática fraudulenta de extrema gravidade. O caso foi encaminhado à Polícia Federal e Corregedoria do INSS para aprofundamento das investigações criminais.
A auditoria constatou existência de quantidade significativa de contratos averbados sem consentimento expresso dos beneficiários. Das operações identificadas como irregulares, 163 contratos foram firmados com benefícios já cessados nos sistemas oficiais do INSS, evidenciando falhas graves nos controles internos do banco. A instituição financeira possui atualmente 1,57 milhão de consignados ativos e já recebeu 14,8 bilhões de reais do INSS mediante descontos em contracheques de aposentados e pensionistas. A suspensão imediata das operações visa cessar irregularidades e salvaguardar interesse público até conclusão dos processos administrativos.
Um caso específico em Fortaleza ilustra gravidade das fraudes identificadas. Beneficiário da capital cearense teve refinanciamento de dívidas realizado sem solicitação e sem autorização em 7 de novembro de 2025. A operação incluiu sete contratos, sendo três deles inexistentes nos sistemas do INSS, que adicionaram 17.073,94 reais ao saldo remanescente do aposentado. O troco registrado no sistema apresentava valor próximo ao montante da fraude, totalizando 17.135,18 reais, mas não foi depositado ao beneficiário. Esta operação exemplifica padrão sistemático de manipulação financeira identificado pela auditoria federal.
Taxas de juros suspeitas revelam manipulação sistêmica
A Controladoria-Geral da União apurou que Agibank realizou operações de refinanciamento com taxas de juros muito abaixo do teto vigente de 1,85% ao mês. Teste inicial identificou 5.222 contratos com taxas inferiores a 0,4%, percentual absolutamente incompatível com realidade de mercado financeiro brasileiro. Verificação mais ampla encontrou 33.437 contratos averbados pelo banco com taxas inferiores a 1%, configurando padrão anormal que sugere registro proposital de valores artificiais para evitar alertas de controles de consistência adotados no momento da averbação.
Esta manipulação sistemática das taxas registradas indica sofisticação das práticas fraudulentas implementadas pela instituição financeira. Especialistas em mercado financeiro ressaltam que nenhum banco opera empréstimos consignados com margens tão reduzidas, dado que custos operacionais e exigências regulatórias inviabilizam rentabilidade nestes patamares. A distorção nos registros oficiais tinha dupla finalidade, segundo investigadores: burlar sistemas automáticos de fiscalização do INSS e criar aparência de regularidade formal que dificultasse identificação imediata das irregularidades por auditores humanos.
O INSS informou que contratos antigos permanecem válidos e beneficiários com empréstimos consignados ativos não precisam adotar medidas imediatas. Aposentados e pensionistas que enfrentarem dificuldades relacionadas à portabilidade bancária, descontos irregulares ou falhas de atendimento devem procurar Ouvidoria oficial para registrar ocorrência. A autarquia assegura que atendimento aos segurados continuará regular e pagamentos não serão afetados pela suspensão. Medida aplica-se exclusivamente a novas operações de crédito consignado que porventura fossem apresentadas pelo banco a partir desta data.
Banco acumula histórico de reclamações judiciais
O Agibank acumula reclamações no Judiciário sobre portabilidade indevida de contas de aposentadoria para o banco. Na área de consignados, instituição tem recebido condenações para indenizar aposentados por descontos indevidos de empréstimos. Sentenças levantadas por veículos de imprensa mostram casos onde banco não apresenta à Justiça prova mínima de que aposentado contratou seus serviços. Nos últimos meses, INSS chegou a suspender contrato dele em razão dessas queixas, levando banco a assinar termo de ajustamento de conduta comprometendo-se a não dificultar portabilidade e ser mais transparente com segurados.
Apurações revelaram que Agibank vinha descumprindo regras centrais do convênio ao dificultar acesso dos beneficiários aos canais oficiais de atendimento. Em vez de encaminhar aposentados e pensionistas para central do Instituto conforme determina contrato, banco teria redirecionado parte das chamadas para seus próprios sistemas. Esta prática criava barreiras artificiais para reclamações, correções cadastrais e orientações sobre consignados, mantendo beneficiários desinformados sobre direitos e procedimentos regulares. Estratégia visava reduzir visibilidade institucional sobre problemas e dificultar fiscalização externa das operações.
Descontos indevidos em benefícios realizados sem autorização expressa ou sem que segurado reconhecesse contratação do empréstimo foram identificados como prática recorrente. INSS afirma que esses casos foram decisivos para determinar suspensão temporária das operações, uma vez que comprometem diretamente renda de aposentados e pensionistas, considerados público vulnerável. Legislação brasileira estabelece proteções especiais para idosos em transações financeiras, exigindo comprovação inequívoca de consentimento informado para operações de crédito que comprometam rendimentos futuros.
Crescimento acelerado do banco levanta questionamentos
O Agibank teve aumento significativo no número de contratos nos últimos cinco anos, saltando de 20 mil empréstimos ativos em meados de 2021 para 409 mil em outubro do mesmo ano. Este crescimento exponencial de aproximadamente 2.000% em período relativamente curto destoa drasticamente de padrões observados em instituições financeiras consolidadas. Na divulgação do balanço do terceiro trimestre deste ano, banco afirmou ter atingido em setembro participação de mercado de 8,8% em operações de crédito consignado para beneficiários do INSS, consolidando-se entre principais players do segmento.
Antes de tornar-se banco, Agibank chamava-se Agiplan e operava como correspondente bancário do empresário gaúcho Marciano Testa. Em 2016, adquiriu falido Banco Gerador de Recife, mudando nome dois anos depois. Em 2019, passou a oferecer crédito consignado e, em 2020, assinou termo de cooperação técnica com INSS para poder ofertar produto a aposentados. Trajetória meteórica da instituição no mercado de consignados chama atenção de especialistas em mercado financeiro, que questionam sustentabilidade de expansão tão acelerada sem comprometimento de controles internos e conformidade regulatória.
Dados obtidos mediante Lei de Acesso à Informação revelam que, de janeiro de 2020 a outubro de 2025, faturamento das 87 instituições financeiras habilitadas pelo INSS para fazer consignados dobrou, alcançando 466 bilhões de reais. Este crescimento vertiginoso do mercado de empréstimos consignados para aposentados e pensionistas atrai crescente atenção de órgãos reguladores preocupados com práticas abusivas. Setor frequentemente registra denúncias de fraudes e ofertas agressivas direcionadas especificamente a idosos, população com vulnerabilidade ampliada por fatores como menor familiaridade com tecnologias digitais e maior susceptibilidade a pressões comerciais.
Banco nega conhecimento de irregularidades e pede acesso aos autos
Em nota enviada à imprensa, Agibank afirmou ter tomado conhecimento da suspensão sem ter sido previamente comunicado ou mesmo com oportunidade de apresentar defesa e esclarecimentos. Banco diz que solicitou acesso aos autos ao INSS, a fim de que possa realizar análise detalhada dos apontamentos apresentados pela autarquia e pela Controladoria-Geral da União. Instituição reafirma que todos os contratos seguem protocolos rigorosos de segurança, como biometria facial, validação documental e cruzamento de dados em bases oficiais. Defesa institucional minimiza gravidade dos achados e atribui eventuais problemas a falhas pontuais.
O banco afirma desconhecer contratações irregulares, mas declara que caso sejam constatadas, adotará providências para saneamento dos trâmites internos, além de absorver integralmente impacto financeiro sem qualquer ônus para clientes ou INSS, com ressarcimento integral dos valores envolvidos. Posicionamento institucional contrasta fortemente com amplitude das irregularidades identificadas pela auditoria federal, que apontam para padrão sistemático de fraudes envolvendo milhares de contratos ao longo de vários anos. Especialistas jurídicos avaliam que defesa genérica apresentada pelo banco mostra-se inadequada diante da gravidade das evidências documentadas.
Em outubro deste ano, INSS suspendeu contratos com bancos Inter, Paraná Banco, Facta Financeira e Cobuccio Crédito Direto, instituições que faziam empréstimos consignados para aposentados e pensionistas. Segundo Instituto, decisões ocorreram por descumprimento de acordos de cooperação entre autarquia e bancos. Estas suspensões anteriores demonstram endurecimento da fiscalização sobre mercado de consignados, com INSS adotando postura mais rigorosa na punição de instituições que violam regras estabelecidas para proteção dos beneficiários. Tendência aponta para intensificação dos controles e redução da tolerância institucional com práticas irregulares.
A suspensão cautelar de novas operações de crédito consignado constitui medida administrativa para cessar irregularidades e salvaguardar interesse público até conclusão dos processos de apuração. Agibank será notificado formalmente e deverá apresentar esclarecimentos detalhados sobre cada uma das irregularidades identificadas. Após conclusão das apurações, INSS decidirá se mantém suspensão, aplica sanções adicionais, exige reparações aos beneficiários prejudicados ou rescinde definitivamente acordo de cooperação técnica. Processo administrativo garantirá direito de defesa e contraditório à instituição financeira, respeitando princípios constitucionais do devido processo legal.
