A 42ª Vara Cível de São Paulo condenou o deputado federal Nikolas Ferreira. O parlamentar deverá pagar indenização de 40 mil reais a mulher transexual. Ademais, decisão refere-se a comentário publicado nas redes sociais em setembro de 2022. Portanto, quando ainda exercia mandato de vereador em Belo Horizonte.
O caso originou-se quando a vítima relatou discriminação sofrida em salão de beleza. A proprietária do estabelecimento recusou-se a atendê-la alegando servir apenas mulheres biológicas. Consequentemente, mulher trans compartilhou experiência nas redes sociais. Entretanto, Nikolas republicou o vídeo adicionando comentários considerados ofensivos pela Justiça.
Deputado afirmou que vítima “é um homem”
Na publicação original, Nikolas escreveu que a mulher “se considera mulher, mas ela é um homem”. Esse comentário gerou repercussão negativa e motivou ação judicial por danos morais. Ademais, defesa do parlamentar argumentou que exercia direito de crítica à ideologia de gênero. Contudo, juiz André Augusto Salvador Bezerra rejeitou essa justificativa.
A sentença proferida no dia 19 de novembro ainda pode ser objeto de recurso. Paralelamente, valor da indenização foi fixado considerando potencial nocivo da conduta. Especificamente, magistrado destacou que declarações de pessoa eleita popularmente carregam maior peso. Portanto, têm capacidade de influenciar comportamento social mais amplamente.
O juiz questionou fundamentação apresentada pela defesa do deputado em sua decisão. Especificamente, indagou sobre o que seria a ideologia de gênero mencionada pelo réu. Ademais, caracterizou o termo como utilizado por determinados grupos religiosos. Consequentemente, concluiu que tais grupos negam direito de autoidentificação de gênero.
Magistrado considera termo ideologia de gênero negacionista
A decisão judicial afirma que sociedade democrática não pode negar direito de autoidentificação. Portanto, liberdade individual inclui possibilidade de atribuir-se gênero diverso do nascimento. Ademais, sentença enfatiza que há negacionismo na chamada ideologia de gênero. Consequentemente, essa perspectiva ignora distinção entre categorias gênero e sexo.
O magistrado ressaltou que diferenciação entre gênero e sexo encontra-se amplamente reconhecida cientificamente. Assim, argumentação baseada apenas em aspectos biológicos não se sustenta. Igualmente, negar identidade de gênero de pessoa transgênero configura discriminação. Portanto, conduta caracteriza violação de direitos fundamentais constitucionalmente protegidos.
Sentença destacou que legitimação de conduta discriminatória torna-se especialmente grave. Quando perpetrada por pessoa eleita pelo voto popular, potencial nocivo amplifica-se. Ademais, postura configura verdadeiro incentivo para que outros estabelecimentos discriminem. Consequentemente, repercussão social da declaração estende-se além da vítima individual.
Nikolas critica decisão e alega censura
Após divulgação da sentença, Nikolas manifestou-se através das redes sociais criticando condenação. O deputado ironizou afirmando que “virou crime chamar homem de homem”. Ademais, declarou que recorrerá da decisão em instâncias superiores. Portanto, processo judicial deve prolongar-se através de recursos.
Esta representa terceira condenação significativa que Nikolas enfrenta por declarações sobre pessoas transgênero. Anteriormente, em abril de 2025, Justiça do Distrito Federal condenou-o a pagar 200 mil reais. Especificamente, essa penalidade referia-se a discurso proferido na Câmara dos Deputados. Consequentemente, parlamentar acumula condenações totalizando 270 mil reais.
Em junho de 2025, Superior Tribunal de Justiça manteve outra condenação do deputado. Ministra Maria Isabel Gallotti negou recurso para derrubar sentença anterior. Especificamente, caso envolvia indenização de 30 mil reais à deputada Duda Salabert. Portanto, múltiplas instâncias judiciais têm confirmado condutas discriminatórias.
Caso da Câmara envolveu uso de peruca e discurso polêmico
O episódio que resultou em condenação de 200 mil reais ocorreu no Dia Internacional da Mulher. Em 8 de março de 2023, Nikolas colocou peruca amarela durante sessão plenária. Ademais, apresentou-se como “deputada Nikole” em discurso considerado transfóbico. Consequentemente, comunidade LGBTQIA+ e movimento feminista reagiram negativamente.
Durante manifestação, deputado afirmou sentir-se mulher naquele momento específico. Igualmente, declarou que mulheres cisgênero estariam perdendo espaço para homens que se sentem mulheres. Portanto, juíza Priscila Faria da Silva entendeu que discurso ultrapassou limites da liberdade de expressão. Consequentemente, configurou verdadeiro discurso de ódio.
Sentença destacou que utilização de peruca em plenário da Câmara reforçou caráter discriminatório. Ademais, magistrada concluiu que dizeres descredibilizam identidade de gênero assumida pela população transexual. Igualmente, discurso insufla sociedade a adotar postura semelhante. Portanto, efeitos da manifestação estendem-se além do momento específico.
Defesa alega imunidade parlamentar em recursos
Advogados de Nikolas argumentaram que discurso estava amparado por imunidade parlamentar constitucional. Especificamente, Constituição Federal garante proteção para opiniões, palavras e votos. Contudo, magistrados têm rejeitado sistematicamente essa alegação. Consequentemente, entendimento judicial prevalece que imunidade não protege discurso de ódio.
Juíza Priscila Faria afirmou que liberdade de expressão é fundamental para democracia. Entretanto, pode ser limitada quando utilizada para incitar conduta criminosa. Igualmente, restrições aplicam-se quando objetivo é exclusivamente ofender. Portanto, difusão de ódio contra grupos vulneráveis não encontra proteção constitucional.
Valor da indenização de 200 mil reais será corrigido monetariamente antes do pagamento. Ademais, recursos serão destinados ao Fundo de Defesa de Direitos Difusos. Consequentemente, dinheiro será utilizado em políticas públicas relacionadas a direitos coletivos. Portanto, penalidade visa reparação social além da individual.
Condenação envolvendo Duda Salabert foi mantida pelo STJ
O caso envolvendo a deputada federal Duda Salabert originou-se em 2020. Época em que ambos os parlamentares exerciam mandatos como vereadores em Belo Horizonte. Especificamente, Nikolas concedeu entrevista afirmando não reconhecer colega como mulher transexual. Consequentemente, declarou: “É biologia. Eu não estou falando algo que eu acho. Ele é um homem”.
Ministra Maria Isabel Gallotti analisou recurso apresentado contra condenação imposta pela Justiça mineira. Contudo, entendeu que valor estabelecido não se revelava nem irrisório nem exorbitante. Ademais, destacou que alteração de indenização só procede quando distancia-se de padrões de razoabilidade. Portanto, manteve sentença condenatória em 30 mil reais.
Decisões judiciais têm sistematicamente reconhecido que transfobia configura crime de racismo. Supremo Tribunal Federal equiparou homofobia e transfobia ao racismo em julgamento de 2019. Consequentemente, Lei 7.716 de 1989 passou a englobar discriminações por orientação sexual e identidade de gênero. Portanto, prática de atos discriminatórios sujeita-se a penalidades criminais e cíveis.
STF equiparou transfobia ao crime de racismo
No julgamento da ADO 26, STF decidiu que homofobia e transfobia constituem formas de racismo. Especificamente, decisão estendeu tipificação penal até superveniência de legislação específica. Ademais, tribunal estabeleceu que repressão penal não alcança liberdade religiosa. Contudo, manifestações religiosas não podem configurar discurso de ódio.
Conceito de racismo compreendido em dimensão social projeta-se além de aspectos biológicos. Ademais, resulta de construção histórico-cultural motivada por justificação de desigualdade. Igualmente, destina-se ao controle ideológico e dominação política de grupos vulneráveis. Portanto, discriminação contra população LGBTQIA+ enquadra-se nessa definição ampliada.
Transfobia pode manifestar-se de diversas formas no cotidiano das vítimas. Desde uso deliberado de nome social incorreto até negação de acesso a espaços públicos. Igualmente, inclui violência física e psicológica contra pessoas transgênero. Consequentemente, Brasil permanece entre países com maiores índices de violência contra essa população.
Parlamentar mantém postura de confronto em redes sociais
Nikolas Ferreira utiliza plataformas digitais para divulgar sua posição sobre as condenações. Ademais, frequentemente ironiza decisões judiciais caracterizando-as como censura. Igualmente, mobiliza base eleitoral apresentando-se como vítima de perseguição política. Portanto, mantém estratégia de confronto público com sistema judiciário.
Deputado conta com significativa base de apoio nas redes sociais com milhões de seguidores. Consequentemente, suas manifestações alcançam ampla repercussão entre eleitores conservadores. Ademais, posiciona-se como defensor de valores tradicionais e liberdade de expressão. Portanto, condenações judiciais são utilizadas como elemento de mobilização política.