STF mantém prisão preventiva de Bolsonaro

Ministros Alexandre de Moraes, Flávio Dino e Cristiano Zanin votam pela manutenção da prisão preventiva do ex-presidente após tentativa de violação da tornozeleira eletrônica e convocação de vigília apontarem risco concreto de fuga

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Ex-presidente Jair Bolsonaro fotografado de perfil vestindo terno escuro e gravata verde, com expressão séria, em evento oficial com pessoas desfocadas ao fundo em ambiente externo com iluminação natural
Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal forma maioria nesta segunda-feira (24) para manter prisão preventiva do ex-presidente Jair Bolsonaro após violação de tornozeleira eletrônica e convocação de vigília identificarem risco concreto de fuga, com votos dos ministros Alexandre de Moraes, Flávio Dino e Cristiano Zanin

A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) formou maioria nesta segunda-feira (24) para manter a prisão preventiva do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). O julgamento ocorre no formato de plenário virtual, sistema no qual os ministros registram votos sem debate presencial direto, com sessão estendendo-se das 8h às 20h para inclusão das decisões. Até o momento, votaram os ministros Alexandre de Moraes, Flávio Dino e Cristiano Zanin, todos alinhados pela manutenção da prisão. Falta apenas o voto da ministra Cármen Lúcia para conclusão do julgamento.

A prisão preventiva foi decretada na madrugada do sábado (22) pelo ministro Alexandre de Moraes, relator do caso da trama golpista, após pedido da Polícia Federal respaldado pela Procuradoria-Geral da República. Bolsonaro cumpria prisão domiciliar com uso de tornozeleira eletrônica desde sua condenação a 27 anos e 3 meses de prisão pela Primeira Turma do STF em setembro de 2025. A conversão para prisão preventiva baseou-se em fatos novos que indicaram risco concreto de fuga e ameaça à ordem pública.

Violação da tornozeleira eletrônica motiva decisão

O Centro Integrado de Monitoração Eletrônica do Distrito Federal (Cime-DF), responsável pela fiscalização dos equipamentos de monitoramento, detectou violação da tornozeleira eletrônica de Bolsonaro às 0h08 da madrugada de sábado. Segundo documentos que constam nos autos, o ex-presidente admitiu ter utilizado ferro de solda para aquecer e danificar o equipamento preso ao tornozelo. Perícia técnica identificou marcas de queimadura ao redor de toda a tornozeleira, sobretudo na área de encaixe do componente eletrônico.

Durante audiência de custódia realizada no domingo (23), Bolsonaro apresentou justificativa de que teria sofrido “alucinação” acreditando haver algum tipo de escuta instalada no equipamento de monitoramento. Segundo ata do procedimento, o ex-presidente declarou não se lembrar de ter passado por surto semelhante anteriormente e sugeriu que o episódio pode ter sido provocado por medicamento que começou a tomar quatro dias antes do incidente. A defesa, em documento enviado ao STF, afirmou que Bolsonaro teve “confusão mental” causada por interação medicamentosa.

Convocação de vigília aumentou preocupação com fuga

A Polícia Federal apontou como segundo fator relevante a convocação pública de vigília nas proximidades da residência de Bolsonaro, organizada pelo senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) para a noite de sábado. A corporação avaliou que a aglomeração de apoiadores poderia criar “ambiente propício” para dificultar fiscalização e facilitar eventual tentativa de fuga, reproduzindo estratégias anteriormente identificadas em investigações de atos antidemocráticos. A mobilização foi considerada tentativa de obstrução do cumprimento de medidas cautelares.

Ministro Alexandre de Moraes, em sua decisão que decretou a prisão preventiva, afirmou que “a informação constata a intenção do condenado de romper a tornozeleira eletrônica para garantir êxito em sua fuga, facilitada pela confusão causada pela manifestação convocada por seu filho”. O relator destacou que essa tentativa somou-se a “gravíssimos indícios da eventual tentativa de fuga” já observados em relação a Bolsonaro e aliados próximos.

Votos dos ministros reforçam fundamentos legais

Ministro Flávio Dino, presidente da Primeira Turma do STF, acompanhou integralmente o voto do relator Alexandre de Moraes pela manutenção da prisão preventiva. Dino afirmou que todos os requisitos legais para a medida estavam presentes, incluindo descumprimento de medidas cautelares anteriormente impostas, risco concreto de evasão e ameaça à ordem pública. O magistrado ressaltou que Bolsonaro já havia violado anteriormente condições da prisão domiciliar, incluindo uso indevido de redes sociais e condutas contrárias às regras estabelecidas.

Ministro Cristiano Zanin, terceiro a votar, também seguiu o entendimento do relator pela manutenção da prisão preventiva. Com três votos favoráveis à manutenção, a maioria já está formada independentemente do voto da ministra Cármen Lúcia. O ministro Luiz Fux, que havia sido voz dissonante no julgamento da condenação de Bolsonaro votando contrariamente à maioria, migrou para a Segunda Turma do STF após o caso e não participa desta votação.

Contexto da condenação no caso da trama golpista

Jair Bolsonaro foi condenado pela Primeira Turma do STF no dia 11 de setembro de 2025 a 27 anos e 3 meses de prisão. A condenação resultou de ação penal relacionada à tentativa de golpe de Estado após eleições de 2022, marcando primeira vez na história brasileira que ex-presidente eleito democraticamente foi colocado no banco dos réus por crimes contra o Estado Democrático de Direito estabelecidos pela Constituição Federal de 1988. A decisão foi tomada por maioria de votos, com quatro ministros favoráveis e apenas Luiz Fux contrário.

Além de Bolsonaro, outros sete aliados foram condenados por integrarem o “núcleo crucial” da trama, recebendo penas entre 16 e 26 anos de prisão. Todos foram considerados culpados por crimes como tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, organização criminosa armada, dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado. A maioria dos réus recebeu também multas, e todos foram condenados conjuntamente a pagar indenização de R$ 30 milhões por danos morais coletivos à sociedade brasileira.

Atual situação processual e recursos pendentes

A prisão preventiva decretada não possui relação direta com o cumprimento da pena de 27 anos e 3 meses imposta a Bolsonaro no processo da trama golpista. Trata-se de medida cautelar fundamentada em risco concreto atual de fuga e obstrução da Justiça. O início do cumprimento efetivo da pena condenatória depende do trânsito em julgado do processo, que ainda não ocorreu devido a recursos pendentes.

Após publicação do acórdão dos primeiros embargos de declaração na última semana, as defesas dos condenados puderam recorrer desde quarta-feira (19), mas nenhum recurso foi apresentado até o momento. As defesas podem seguir dois caminhos processuais: apresentar novos embargos de declaração ou tentar embargos infringentes. Segundo jurisprudência do STF, embargos infringentes somente são cabíveis quando dois dos cinco ministros divergem na decisão. No julgamento que condenou Bolsonaro, apenas ministro Luiz Fux votou contrariamente, tornando alta a probabilidade de rejeição desse tipo de recurso.

Condições da prisão na Superintendência da PF

Bolsonaro permanece detido em sala especial de 12 metros quadrados na Superintendência da Polícia Federal em Brasília, espaço que passou por melhorias recentes. O local conta com cama de solteiro, ar-condicionado, televisão, frigobar, armários e banheiro privativo, configurando acomodação em regime de estado maior. Atualmente o ex-presidente está sem tornozeleira eletrônica, que foi retirada para perícia técnica após a violação.

O ex-presidente já recebeu visita da ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro. A defesa solicitou e obteve autorização para visitas dos filhos Carlos, Flávio e Jair Renan Bolsonaro. Anteriormente, na sexta-feira (21), véspera da prisão preventiva, Bolsonaro havia recebido visita do deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG). A defesa havia solicitado ainda que ministro Alexandre de Moraes concedesse prisão domiciliar humanitária, tema que não foi analisado de imediato pois a sessão extraordinária concentrou-se exclusivamente na manutenção da prisão preventiva.

Argumentos da defesa rejeitados pela maioria

Em nota divulgada após decretação da prisão, a defesa de Bolsonaro argumentou que a justificativa estaria “calcada em uma vigília de orações” e afirmou que recorreria da decisão. Os advogados pedem que o ex-presidente retorne ao regime de prisão domiciliar sob argumento de saúde debilitada e alegam que violação da tornozeleira teria ocorrido em quadro de “confusão mental” causada por medicamentos receitados por diferentes médicos sem coordenação adequada.

Advogado criminalista Jader Marques avaliou que o cenário não favorece a defesa de Bolsonaro. “A defesa técnica terá enormes dificuldades para justificar a tentativa de violação do equipamento com ferro quente. A tese apresentada é bastante frágil: ‘curiosidade'”, afirmou o especialista. Marques destaca que alegação de alucinação ou surto medicamentoso exigiria comprovação médica robusta, incluindo exames e avaliações psiquiátricas contemporâneas ao fato, elementos não apresentados até o momento pela defesa.

Próximos passos processuais e perspectivas

Caso a Primeira Turma mantenha definitivamente os fundamentos de Alexandre de Moraes, Bolsonaro permanecerá preso preventivamente enquanto o processo segue suas fases e até nova reavaliação da prisão em até 90 dias, conforme exigido pela legislação processual penal brasileira. A manutenção da prisão preventiva pode ser revista periodicamente mediante apresentação de fatos novos ou alteração das circunstâncias que motivaram a medida.

Semana também será marcada pelo avanço dos desdobramentos da ação penal do golpe. Terminou nesta segunda-feira, às 23h59, o prazo para apresentação dos segundos embargos de declaração pelos réus condenados. Pelas decisões recentes do STF, os condenados somente iniciam cumprimento efetivo das penas após julgamento dos segundos embargos. Se as defesas recorrerem por meio de embargos considerados meramente protelatórios, a Primeira Turma pode determinar trânsito em julgado da condenação, iniciando execução da pena de 27 anos e 3 meses em regime fechado.

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