Marina Silva: “Dinossauros não sabiam, nós sabemos”

Em entrevista exclusiva ao The Guardian, ministra admite que resultados da cúpula na Amazônia foram aquém do necessário e cobra “roteiros” práticos para fim dos combustíveis fósseis.

Uma fotografia em close-up da Ministra do Meio Ambiente do Brasil, Marina Silva, usando óculos e olhando para cima com uma expressão pensativa.
Marina Silva alerta clima e compara crise atual à extinção: "Dinossauros não sabiam, nós sabemos". Veja a cobrança para a COP30.

Apenas alguns dias após o encerramento da histórica COP30 em Belém, a Ministra do Meio Ambiente do Brasil, Marina Silva, quebrou o silêncio diplomático com uma avaliação franca e preocupante sobre o legado do evento. Em entrevista exclusiva publicada hoje (03) pelo jornal britânico The Guardian, Marina não dourou a pílula: os esforços globais consolidados na capital paraense foram “insuficientes” para garantir a segurança climática do planeta. Utilizando uma metáfora poderosa, ela comparou a atual inércia dos governos à extinção pré-histórica, mas com uma distinção ética fundamental: “Os dinossauros não sabiam que um meteoro estava vindo em sua direção. Nós sabemos o que está vindo, sabemos o que precisa ser feito e temos os meios para fazê-lo, mas não tomamos as medidas necessárias”.

A declaração marca o tom da diplomacia brasileira para o ciclo pós-COP. Segundo a ministra, a cúpula na Amazônia serviu para “revelar a verdade” de que a humanidade tem usado as conferências climáticas para “comprar tempo quando não temos mais tempo”. A frustração é palpável, especialmente após a remoção de menções explícitas à eliminação gradual de combustíveis fósseis do texto final, uma manobra liderada por países produtores de petróleo como a Arábia Saudita, que bloquearam o consenso ambicioso buscado pelo Brasil.

Legado de Belém e o futuro imediato

Apesar das críticas, Marina Silva defendeu que a COP30 não foi em vão. O evento conseguiu, pela primeira vez, colocar na mesa de negociações um debate sério sobre “roteiros” para a transição energética, algo que, segundo ela, deveria ter começado há 30 anos. O plano brasileiro agora é levar essa agenda adiante unilateralmente e em parcerias multilaterais, focando na criação de cronogramas práticos para reduzir a dependência de petróleo, carvão e gás ao longo do próximo ano. “Reconhecemos que o resultado ainda não foi suficiente, mas devemos reconhecer que o que foi posto à mesa é a resposta na qual deveríamos estar trabalhando há décadas”, afirmou a ministra.

O “insuficiente” citado por Marina refere-se à janela de oportunidade cada vez mais estreita para evitar um aquecimento catastrófico acima de 1,5ºC. Ela alertou que não há mais “margem para insuficiência”, restando apenas uma “fresta minúscula para ação”. O Brasil, como anfitrião, tentou liderar pelo exemplo, apresentando dados de redução de 50% no desmatamento da Amazônia nos últimos três anos, provando que é possível conciliar preservação com crescimento do agronegócio.

Ameaça climática visível na floresta

A realização da cúpula no coração da floresta serviu para materializar a ciência diante dos olhos dos líderes mundiais. Marina destacou que a seca histórica dos rios amazônicos e a perda de umidade da floresta são a “ciência materializada em três dimensões”. A ministra lamentou que, mesmo com a evidência física do colapso ecológico ao redor do centro de convenções em Belém, interesses econômicos “extrativistas” ainda tenham força para diluir acordos vitais.

Para o ciclo de 2026, o Brasil já traçou sua rota: participará da primeira conferência internacional sobre transição justa na Colômbia e continuará pressionando por financiamento climático real. A fala sobre os dinossauros serve como um ultimato moral: diferentemente dos répteis extintos, a humanidade tem a escolha de desviar o curso, mas a cada ano de “insuficiência”, essa escolha se torna mais teórica e menos prática. A COP30 terminou, mas a verdadeira batalha pela sobrevivência, segundo Marina, apenas mudou de fase.

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