Lula ataca emendas: ‘Sequestro do orçamento’ e ‘erro histórico’ no Congresso

Em reunião do Conselhão, petista afirma que Executivo perdeu capacidade de gestão, nega crise institucional mas dispara contra modelo atual de distribuição de recursos.

Presidente Lula com a mão na cabeça e expressão de preocupação, com a bandeira do Brasil ao fundo, ilustrando a tensão com o Congresso.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva reage durante discurso; petista afirmou que o Congresso realizou um "sequestro do orçamento" e pediu mudanças. (Foto: Ricardo Stuckert/PR)

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva elevou o tom contra o Congresso Nacional nesta quinta-feira (4), classificando o atual modelo de emendas impositivas como um “grave erro histórico”. Em discurso durante a reunião do Conselho de Desenvolvimento Econômico Social Sustentável, o chamado “Conselhão”, no Palácio do Itamaraty, Lula afirmou categoricamente que o Legislativo realizou um “sequestro do orçamento”. A declaração ocorre em um momento de tensão renovada entre os Poderes, logo após a Comissão Mista de Orçamento aprovar regras que obrigam o governo a pagar 65% das emendas parlamentares antes das eleições de 2026.

Presidente denuncia captura de verbas

Lula argumentou que a governabilidade do Poder Executivo foi severamente comprometida pela fatia gigantesca de recursos que hoje é manejada diretamente por deputados e senadores. Segundo o presidente, o fato de o Congresso controlar cerca de 50% do Orçamento discricionário da União — aquele livre para investimentos — inverte a lógica do presidencialismo. “Eu sinceramente não concordo com as emendas impositivas. Acho que o fato de o Congresso Nacional sequestrar 50% do Orçamento da União é um grave erro histórico”, disparou Lula. Para ele, o Brasil vive uma distorção onde quem executa a política pública não tem a chave do cofre para definir prioridades nacionais, ficando refém de interesses paroquiais.

O termo “sequestro” foi utilizado para ilustrar a perda de autonomia do governo federal sobre o planejamento financeiro. Antes, o Executivo tinha poder de barganha para liberar verbas conforme o andamento de projetos e alianças políticas; hoje, com as emendas impositivas (obrigatórias), o dinheiro sai automaticamente, independentemente da vontade do Planalto ou da eficiência da aplicação. Lula ressaltou que não se trata de uma briga pessoal com o Congresso, mas de uma discordância estrutural sobre como o Estado brasileiro deve operar. “Vocês acham que nós do governo temos algum problema com o Congresso Nacional? A gente não tem. Mas eu não concordo”, ponderou, tentando equilibrar a crítica institucional com a necessidade de manter pontes com o Legislativo.

Petista critica apropriação de recursos

A fala do presidente também mirou a recente derrubada de vetos presidenciais em pautas ambientais, que ele atribuiu à influência desmedida de setores específicos, como o agronegócio, sobre a pauta legislativa. Lula lembrou que, ao vetar trechos da lei de licenciamento ambiental, tentou proteger o próprio setor produtivo de sanções internacionais, mas foi derrotado pela “apropriação de recursos” políticos por parte de uma bancada que, segundo ele, não enxerga o cenário global. “Essa mesma gente que derrubou meus vetos, quando a China parar de comprar soja… vai vir falar comigo outra vez”, alertou, sugerindo que o Congresso age com visão de curto prazo.

Além disso, o contexto da crítica envolve a aprovação, nesta mesma semana, da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) para 2026. O texto validado pelos parlamentares impõe um calendário rígido de pagamentos, forçando o governo a liberar bilhões de reais em emendas “Pix” e de comissão até julho do ano eleitoral. Para o Planalto, isso engessa a gestão e transforma o Orçamento da União em um financiador automático de campanhas de reeleição de deputados, drenando recursos que poderiam ir para obras estruturantes do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento).

Chefe do Executivo ataca retenção fiscal

Ao aprofundar a análise, Lula sugeriu que a única solução para esse impasse é a via eleitoral. “Você só vai acabar com isso quando mudar as pessoas que governam e que aprovaram isso”, disse, em um recado direto aos eleitores para a renovação das cadeiras legislativas em 2026. A “retenção fiscal” promovida pelo Congresso criou, na visão do governo, um semipresidencialismo na prática, onde o presidente tem a responsabilidade pelos resultados econômicos, mas não tem a ferramenta principal para alcançá-los: o dinheiro.

A reação nos bastidores de Brasília foi imediata. Lideranças do Centrão, bloco que dá sustentação a Arthur Lira (PP-AL) e Rodrigo Pacheco (PSD-MG), viram na fala de Lula uma tentativa de transferir a culpa pelas dificuldades fiscais do governo para o Legislativo. Parlamentares argumentam que as emendas democráticas descentralizam o recurso, levando dinheiro para municípios que antes eram ignorados pela burocracia de Brasília. No entanto, especialistas apontam que a pulverização da verba sem critérios técnicos de fato piora a qualidade do gasto público, corroborando a tese de ineficiência levantada pelo presidente.

Mandatário condena domínio do caixa

Por fim, o discurso de Lula no Itamaraty marca uma mudança de estratégia. Ao verbalizar publicamente o incômodo com o “domínio do caixa”, ele chama a sociedade para o debate sobre quem realmente manda no país. A disputa pelo Orçamento de 2026 promete ser a batalha final deste mandato, com o governo tentando recuperar, via Supremo Tribunal Federal (STF) ou pressão política, parte do poder que foi transferido para o Legislativo nos últimos anos.

Portanto, a expressão “erro histórico” deve ecoar nos corredores do Congresso nos próximos dias. Se o “sequestro” continuará ou se haverá um resgate da autoridade presidencial, dependerá da capacidade de articulação política do governo e, em última instância, da decisão das urnas sugerida pelo próprio Lula.

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